O draft do meu romance #2, tal como o do #1 enquanto era escrito, contem algumas instruções para o que deve acontecer, em linhas gerais, só para não perder o fio à meada quando interrompo uma sessão com a cabeça cheia de ideias para as próximas 50 páginas, e essas instruções deveriam servir para os dias seguintes, para não estar perdido. Às vezes, num assomo de imperdoável ingenuidade, acho que já delineei o romance todo e que a partir dali é só colorir dentro das linhas, numa rotina pachorrenta. Contudo, vejo-me constantemente a apagar e reescrever essas instruções. Quando volto a elas passado semanas ou mesmo meses, especialmente o bloco no início do draft que estabelece (risos) o que quero fazer daquilo tudo, sinto-me como um paciente com alzheimer que descobre um post-it escrito com a sua caligrafia com misteriosos e incompreensíveis recados que pediu a si próprio para fazer. Depois volto a meter mais instruções e ideias que me vão aparecendo nos momentos em que pego no cachimbo (imaginário) e reflicto sobre o que faria daquilo um enorme livro, ambicioso, assim de nível upa upa, em vez de apenas uma coisa que é a possível. E combato o mesmo tipo de ansiedade que me acomete quando, a explorar com a bicicleta de BTT, me meto por um caminho a descer, sem saber se tem saída ou se vou dar de trombas com um rio ou uma cerca de arame farpado e vou ter de subir tudo outra vez, para nada.