difícil

A cabeça, vazia, não quer escrever nada de jeito. Entre trabalho a partir de casa e tomar conta ou simplesmente olhar para o bebé, sobra pouca vontade para fazer mais com o tempo livre do que jogar ps3. Uma lesão tem-me tirado da corrida há uma semana apenas e já me parece uma eternidade, outra vida. Hoje fiz 60km de btt para compensar e soube-me bem, mas durante a semana não dá. Por falar em lesão, a A. deu cabo de um pé num ensaio e tivemos de ir ao hospital à meia noite quando aquilo arrefeceu e começou a latejar. A poucos dias da estreia da peça no Nacional, está de muletas e a coxear, a fazer gelo. Vai recuperar até à estreia, acredito, mas é uma situação de pesadelo e só me lembra as capas dos jornais desportivos a especular com o Cardozo estar ou não apto para o Benfica Sporting da taça. Espero que corra tão bem como esse episódio. Em compensação, hoje a Júlia deu gargalhadas e as gargalhadas dela são o melhor som do mundo. Parece um boneco inventado pelo Jim Henson, mas em melhor. A nossa televisão ao jantar é olhar para ela a contemplar o punho fechado, as sobrancelhas em nítida concentração esforçada. Parece-me que ela encara os próprios membros como objectos que consegue mover pela força da mente, ma que não fazem parte dela. Li algures que os bebés nem têm conceito de “eu” e do “outro” e que para eles todos os humanos fazem parte deles próprios. É bonito.

a 8ª arte?

Um dos joguinhos mais divertidos e originais a que já joguei. Vale pelo argumento delirante, pela banda sonora jazzy, pelo trabalho de desenho que lembra em parte o universo que Christopher Hewlett criou para os Gorillaz. Quanto à lógica dos puzzles que temos de resolver, trouxe-me de volta ao espírito pragmático da série Monkey Island. Vai desde dar um conjunto de canos de esgoto a um escocês para ele improvisar uma gaita de foles e invocar o monstro do lock ness que começa a dançar o boogie woogie permitindo-nos atravessar um lago até à solução mais do que lógica de instalar uma chaminé numa sanita de uma cela para que o Pai Natal preso numa base secreta possa escapar…

one happy dog

One-Happy-Dog-l

Vimos, há dias, um filme de terror muito mau, o Dark Circles. A premissa interessou-nos: um casal fica privado do sono por um bebé a chorar constantemente e começa com alucinações. Ficou por aí o interesse teórico, o filme tem problemas de argumento graves e actores muito maus. Retive uma deixa: “não quero que o meu filho cresça numa cidade”. Acho que foi a única coisa que retive do filme. Isso e uma cena em que um capataz de uma obra reage ao seu carro a ser partido a pé de cabra pelo pai do bebé, tresloucado com o ruído das máquinas do estaleiro, com um “wow wow wow tenha calma” e conclui com um “você precisa de dormir” e o deixa ir à vida dele. Afinal de contas o carro que o homem partiu não era dele. Era só um adereço num filme. Aliás, ele nem é capataz de uma obra, é apenas um actor a fingir que tem um carro que foi partido. Bom, mas como todos os filmes de terror presos a clichés, este não falhou o clássico da mudança da cidade para a casa no campo, isolada e com uma cave cheia de tralha sombria. Eu cresci no campo e tenho muita pena que a minha Júlia não cresça no campo, a começar pela possibilidade de termos cães, esse elemento fundamental à felicidade humana. Mas também tenho pena que não cresça no campo português de 1981 em que ficávamos sem luz durante dias. Isso é que era. Hoje, o que há de comparável? A Marmeleira do Pacheco Pereira que fica sem internet umas horas? Crescer no campo tem lados muito positivos que são bem explorados nestes filmes de terror. À distância, apesar de ter adorado a minha infância, também sei que passei noites aterrado e que na altura senti um alívio enorme quando nos mudámos para um apartamento em Torres Vedras. No campo, a minha imaginação fértil era estimulada por ratazanas no sótão, aranhas em todos os cantos, tábuas a ranger com o vento, relógios de pêndulo com um TIC TAC lúgubre, salamandras a rosnar chamas, vento a uivar nas árvores, ausência de civilização a não ser o escape de uma famel na aldeia vizinha ou os faróis de um carro na estrada sinuosa, filtrados pelas duas linhas de estores entre-abertos, com o quadriculado de luz a deslizar pela parede… Tenho pena que a Júlia não vá experimentar estas coisas e que só as possa ver em filmes de terror de fraca qualidade.

estragar a vida aos pobres

Quando João César das Neves diz coisas como “aumentar o salário mínimo é estragar a vida aos pobres” está a pedi-las.  Às vezes penso que ele escreve certas opiniões num espírito de martírio católico, pronto para ser fustigado. O que JCN devia querer dizer é que o aumento do salário mínimo pode destruir ou dificultar a criação de empregos menos qualificados, normalmente reservados para a população mais desfavorecida, o que estaria correcto. O problema é que JCN deixa implícito que vida de pobre não é vida estragada (talvez porque o reino do Céu a eles lhes pertence) e que o montante do salário mínimo actual permite ter uma vida não estragada. É JCN vintage, mas já disse coisas piores. Confesso que me irrita um pouco mais a quantidade de pessoas que defende um aumento do salário mínimo sem sequer entender que existe outra face da decisão. O que faz com que o salário mínimo português seja de 480 euros e o francês de 1485 euros? Temos sindicatos na sorna? Não me parece. Quanto ao salário mínimo, apesar de me considerar liberal, sou a favor da sua existência. A discussão é válida, na Alemanha foi abolido. Neste artigo podemos alguns resultados. Sou a favor do salário mínimo porque creio que serve de incentivo à gestão das empresas para criar negócios com postos de trabalho suficientemente produtivos e por outro lado elimina empresas que não conseguem ter postos de trabalho que possibilitem um salário mínimo. E isso briga a investigação e desenvolvimento de processos, tecnologia, marketing e gestão, o que por sua vez faz crescer a economia e o bem estar geral. Considero a fixação de um valor um pouco como determinar que os trabalhadores precisam de almoçar quando têm fome, por exemplo, ou que precisam de dormir. Não existindo salário mínimo, uma empresa poderia ser competitiva se conseguisse arranjar quem estivesse disposto a trabalhar muito barato (e sem comer e sem dormir). Não existindo do lado dos trabalhadores – a maior parte deles, especialmente os jovens – uma estrutura semelhante a sindicatos capaz de negociar, instalava-se uma concorrência de ver quem consegue mais trabalhadores ao mais baixo preço em vez de se estudar como é que 5 ou 6 putos conseguem manter um McDonalds operacional em hora de ponta depois de uns dias de formação.

Uma das falhas (para mim) no raciocínio liberal de JCN é considerar que permitindo o acesso ao mercado de trabalho dos menos qualificados / pobres, lhes estamos a dar uma oportunidade de ganhar qualificações e ser mais produtivos, logo, num futuro próximo serem mais bem pagos e deixarem de ser pobres. Friedman também dizia que o salário mínimo era uma lei anti-negro porque dificultava a entrada dos pretos no mercado de trabalho. Pode funcionar na terra dos american dreams, mas não acredito que tenha aderência à realidade. Não percebo como um sistema concorrencial como o mercado de trabalho dos países desenvolvidos tem lugar para promover todos os caixas de supermercado, operários, assentadores de tijolos ou empregados de mesa a CEO’s quando fizerem 45 anos. Existem profissões que não conferem nenhuma qualificação relevante, estejamos a recolher lixo 1 ano, 5 anos ou 10 anos. No exemplo do artigo sobre a alemanha, vemos um repositor de supermercado que ganha 3,5 euros à hora. Que progressão de carreira espera um repositor de artigos? Podemos responder: nenhuma, mas é uma profissão digna. Então se é digna, tem de ter um salário digno, mesmo um que não tenha directa relação com a produtividade ou qualificação daquele trabalho específico.

Quanto ao aumento do salário mínimo agora, tenho reservas. Não temos moeda própria. Antes, com o escudo, era possível ajuste com desvalorização cambial. Agora o ajuste só se consegue fazer directamente no custo do trabalho. Portugal tem uma das produtividades mais baixas da Europa e parece-me desajustado aumentar o salário mínimo neste contexto de elevado desemprego, ajuste e recessão económica. Mas para discutir bem este tema seria interessante saber a partir de que montante mensal se consegue ter uma vida digna,  uma vida não-estragada, estudando um cabaz de bens e serviços. Só isso, por si, é uma discussão complicada (os bifes da Jonet, entram neste cabaz? a RTP entra neste cabaz?). Mas assumindo que conseguimos chegar a um valor considerado justo e que esse valor é muito superior ao salário mínimo actual, por exemplo, 700 ou 800 euros, então, o que fazer?

48

Ontem fiz a 1ª Corrida do ISCTE (10K) aqui pelo Campo Grande com o tempo de 48:36. Em Outubro fiz 52:16 e em Setembro 56:30 em corridas na mesma distância. Fico sempre surpreendido com os resultados dos dias de corrida. Por treinar regularmente e fazer testes de tempo, tenho noção do que consigo fazer e da minha evolução. Mas chega o dia da corrida e acabo por fazer melhor do que os treinos me indicavam. Correr com centenas, milhares de pessoas,  é como voar num bando de aves migratórias. Não queremos ficar para trás e a diluição do esforço coletivo por todos parece relativizar a nossa própria dor. Quando somos principiantes é difícil não melhorar se treinarmos. Imagino que para atletas que estão nos limites do seu potencial, tudo possa ser mais frustrante, pois deve ser desanimador treinar meses para uma corrida, um evento, e as coisas correrem pior do que se espera e ver os tempos a decair. Também eu um dia vou chegar ao meu humildade potencial. Esse ponto existe para todos, um cume a partir do qual estamos em decadência da idade, mas na corrida esse ponto é objetivo e mensurável. Como não sou atleta, isso não me preocupa, mas não deixará de ser simbólico um dia fazer uma corrida pior do que a anterior e outra ainda pior nos meses seguintes.

os jedis dos mercados e as profecias

Tropecei neste artigo de opinião de Marco Silva no DE e fiquei impressionado. Começa logo de forma impressionante:

Inadvertidamente ou não o ministro Rui Machete fez o melhor serviço ao país desde que iniciou funções, desmascarando com as suas declarações a falácia existente sobre a sustentabilidade da dívida e o regresso aos mercados, e colocando o dedo na ferida que outros têm vindo a esconder, como o primeiro-ministro e o seu vice, que se apresaram a desmenti-lo.

Vamos só aqui colocar uma fotografia desta pessoa que fez o melhor serviço ao país desmascarando falácias:

paulo

Perdão, ministro errado, este foi o que prestou o grande serviço à Pátria modernizando a mentalidade rígida e retrograda dos chineses ao apresentar-lhes o conceito de pontualidade lusitana. Referia-me a este:

Rui-Machete

É realmente uma pessoa que tem um ar de prestar serviços à pátria e desmascarar falácias. Na foto, parece mesmo estar a perscrutar uma falácia no horizonte longínquo. Aguardemos. O artigo está linkado, é de ler, mas para mim o parágrafo que mais sobressai é este:

No mundo financeiro a informação é o activo mais precioso. Julga-se que um investidor que arrisca 500 milhões de euros em dívida nacional está à espera que um ministro lhe diga para onde vai o seu investimento? Os investidores e os “mercados” sabem mais de olhos fechados que nós de olhos abertos e gastam fortunas para ter essa informação. Baseiam-se em factos fundamentais e, nesses, o segundo resgate com um programa cautelar ou não pelo meio é o caminho inevitável.

Nunca me tinha deparado com uma fé tão inabalável nos investidores e nos mercados, assim como na relação entre o preço de um bem e a sua utilidade, neste caso, o bem precioso da informação. Lembra-me a fé que eu tinha nos meus Pump da Reebok que ainda me custaram uma mão cheia de contos. Acreditava que me faziam saltar mais alto a jogar basket, até ao dia em que apareceram os Air Jordan e a cotação dos Pump da Reebok foi por água abaixo, pois os Air Jordan permitiam voar. Ora, se gastam fortunas na informação, é para saberem mais de olhos fechados que nós de olhos abertos (e por nós, entenda-se o leitor que tenha a infelicidade de não ser um investidor com um pé de meia que lhe permita pagar informação decente e fique limitado a ter de ler jornais online).

Então o leitor julga mesmo que os mercados não sabem mais de olhos fechados do que você de olhos abertos? Não se tem visto tão bem na história dos mercados como os investidores especialistas são os primeiros a antecipar o crashes e os defaults e que só nós é que ficamos agarrados a bonds da Grécia, a ações de dot.coms, a fundos de imobiliário espanhóis ou com o dinheiro empatado no BPP?  Os investidores até têm o perfil psicológico de Paulo Portas num modelo e previram o arrufo do “não formo governo” e nem sequer pestanejaram. A subida das taxas após essa “crise política” deveu-se unicamente ao nervosismo dos não-investidores que gostam é de ler a Bola e o Record.

Os mercados são um jogo de soma nula, mas quem paga mais por informação fica com as parcelas positivas e quem paga menos ou nem sequer entra nos mercados, paga as favas, como muito bem dizem os especialistas económicos da CGTP. Os investidores são como jedis, acredite. Às vezes, só para não competirem connosco de forma injusta, até assumem o handicap de fechar os olhos e usar a force e mesmo assim têm taxa de rentabilidade superiores às nossas, mesmo que estejamos de olhos bem abertos e com dois cafés em cima a olhar para relatórios da S&P.

Não sendo um jedi dos mercados, por motivos profissionais, tive recentemente de investigar as tendências de economias distintas: países da Europa, países do médio oriente e do sudoeste asiático. O objetivo era obter as melhores estimativas para o risco associado a investimentos em empresas de um determinado sector nessas economias e quais as perspetivas de crescimento económico desses países. Como não tenho acesso a informação milionária, para um mero mortal, o exercício é muito menos ‘matemático’ e objetivo do que se poderia julgar, apesar de redundar em números muito claros (% de crescimento do negócio e custo do capital / taxa de desconto). Até pedi a opinião de dois amigos que tomei por jedis, tendo em conta as respetivas profissões, mas enganei-me, só me vieram com uma treta do “bom senso” para cima. Eu disse-lhes “ó que c**lho pá, preciso de uma % para o crescimento económico nos próximos anos e vocês que são economistas e brokers da city vêm-me com bom senso?”

E com isto, não pude deixar de fazer zoom out ao meu próprio trabalho e à necessidade que tem de pressupostos e o chamado “bom senso” e pensar em todas as decisões que se tomam por esse mundo fora e que fazem isto girar. Uma delas é se vão poder fazer fiado a Portugal a uma taxa abaixo do limite que o especialista ministro Rui Machete determinou (4.5%), prestando um grande serviço à Nação. Ora bem, se há uma coisa de que podemos esta certos é que um yield sobre uma dívida soberana representa as expectativas do mercado quanto ao risco associado a essa dívida. Uns podem apostar que o risco vale a pena porque a Merkl precisa do Euro. Outros podem achar que é muito alto porque o contexto político não é de fiar, especialmente se Portugal não for apurado para o Mundial. Outros acham mais interessante apostar que o ouro vai desvalorizar nos próximos tempos e outros ainda que se calhar é melhor comprar um carro agora que o mercado está mais barato e se conseguem bons descontos.

O mercado está cheio de auto-profecias. No fundo, se um governo assume que precisa de um 2º resgate se um número rondar uma fasquia mágica de 4.5%,  a profecia cumpre-se à medida que não se cumprir a profecia muito otimista do Primeiro Ministro de que não vamos precisar de segundo resgate. Neste momento, alguma da informação mais valiosa para quem quer investir em dívida portuguesa é aquela que é discutida nas reuniões do conselho de ministros (não sei se será tão valiosa como o iPhone da Merkl, mas…) Talvez alguém diga “epá, se os juros não baixam de 4.5% estamos fodidos!”. Não sei se usam este tipo de linguagem no conselho de ministros, como não tenho 500 milhões, não consigo ter acesso às escutas que passam em directo num canal hiper-premium da Bloomberg a que só quem tem mais de 500 milhões tem acesso. Mas o Machete, arvorado em Snowden, registou e divulgou oportunamente, perante uma plateia de indianos. Paradoxalmente, também fomos um pouco empurrados para esta situação porque também profetizaram que éramos lixo. O que é bonito é ser uma pessoa que tem a capacidade de influenciar o mercado com as próprias profecias, como as agências de rating ou um Ministro sagaz. A nós, meros mortais, resta-nos flutuar ao sabor destas misteriosas correntes.

isto vai lá

Eu e a minha filhota ainda andamos a tentar entender-nos, um pouco como o Duricic e o Jorge Jesus. A mamã está em ensaios para uma peça de teatro (no Nacional e tudo, ena!) e nós ficamos várias tardes e noites sozinhos os dois, com um bom stock de leite fresco. As primeiras horas são relativamente pacíficas, mas a última hora pode ser simplesmente infernal. Creio que tive pelo menos quatro colapsos nervosos nos últimos dias, um deles deixou-me a tremer e incapaz de falar durante o resto da noite. Fiquei a chuchar o dedo em posição fetal no sofá da sala, com os olhos vidrados no vazio. Uma coisa surpreendente é o endurance dos bebés na modalidade de choro extremo. Desengane-se quem pensa que um bebé, tal como uma namorada, pode chorar até lhe passar um trauma qualquer e mesmo assim dormir sossegada. Um bebé vai sempre em crescendo. Eu suspeito que a certo ponto pode mesmo entrar em meltdown nuclear ou em modo super choreiro dragon ball. Mas ontem fizemos um grande progresso. Esfomeada, mamou um biberon inteiro de uma assentada, algo inédito, pois costuma rejeita o biberon após confirmar que não se trata de uma fonte da produtora. O truque é mantê-la adormecida no baby carrier até a fome a fazer ressuscitar com uma fome desgraçada e aí já não se faz esquisita. E por falar nisso, está a começar aos pontapés aqui no carrier. Over and out!