não sei que bicho é este

A minha filha às vezes assusta-me com o seu entusiasmo social vis a vis outros seres do seu tamanho ou apenas um pouco superiores. Não se limita a sorrisos e tentativas de conversa. Já me aconteceu ir a uma farmácia e quando dei por isso tinha três crianças à volta do carrinho a brincar com ela, encantados. Eu estive para os avisar que ela estava com varicela, mas não o fiz e deu-me gozo. Há dias, a entrar no pingo-doce com ela no carrinho, vem uma mãe com um filho pela mão, o puto devia ter 5 anos. A minha filha fez o seu comportamento normal nestas ocasiões: esticou-se toda para fora do carro, riu-se, fez UUHHHHHHHHH e esticou os dois indicadores na direcção do miúdo, como quem diz you’re the man! 😉 Naturalmente, como sucede nestas ocasiões em que um homem é alvo de tal entusiasmo, a criança em questão assustou-se um pouco e agarrou uma perna da mãe. Ouvi-o comentar, já nas minhas costas “mãe… porque é que aquela menina fez assim com as mãos para mim?” ao que a mãe respondeu “sei lá filho”, o que é compreensível, visto que o puto para além de não me parecer muito esperto, não devia ser de boas famílias e não percebo este entusiasmo da minha filha. Tenho ainda muito trabalho a fazer com esta pequena, mas pode dar-se um caso clássico de inversão de personalidade ao crescer um pouco mais, bebés nervosos e extrovertidos que ficam crianças calmas e introvertidas que são precisamente as crianças ideais para quem quer escrever e ler sossegado. Ultimamente tem havido uma inovação na nossa rotina: levo-a de bicicleta à creche no baby carrier. Dado que a minha bicicleta tem um perfil um pouco desportivo, ela vai quase a voar deitada (mas confortável) com o seu grande capacete, a ver o céu e as copas das árvores e a rir-se para mim, a um palmo da minha cara. Vamos pela ciclovia, não fiquem preocupados.

um movimento…

… pela pontualidade. Isso é que era. Com direito a campanha. A minha OCD sofre em Portugal, sofre mesmo. É raro as coisas começarem a horas. E nem me refiro ao mundo do trabalho em particular. O exemplo cultural mais claro é o clássico jantar marcado para as 20:30, se chegamos lá às 20:30 somos os primeiros e ficamos à espera que chegue toda gente.O que só acontece por vezes pelas 21:30, às vezes 22:00…. Eu consigo conceber que as pessoas sejam demoradas. O que não consigo entender é por que motivo não marcam para as 21:30. É como se as horas fossem abstractas. Vieram os telemóveis e ainda piorou porque agora se pode ligar a dizer que se está mesmo mesmo a chegar (o que geralmente significa que se acabou de sair de casa).

smoker

Como ex fumador de maço por dia, acho sempre curioso quando não-fumadores discutem sobre fumar, estratégias para se deixar de fumar, o que devia ser feito, o nojo que é, o irracional que é… Lembra-me um pouco as pessoas que nunca tiveram uma depressão e que dizem a um depressivo “devias sair com os amigos,não faz sentido nenhum estares metido na cama com os estores para baixo”. Óbvio, é com as melhores intenções e sei perfeitamente que a Maria sabe que o inferno está cheio delas, mas são tiros ao lado do porta-aviões. Também acho curioso que muitos fumadores apresentem aquela assertividade na suposta escolha de fumar, uma escolha que na realidade não existe, visto ser um vício e um dos mais poderosos. Um dos exemplos são os textos de Miguel Sousa Tavares sobre o tema, um case-study de tentativa de racionalizar o irracional e de um maniqueísmo extremo. Não é raro. Uma vez, um amigo disse-me que o fumo protege os pulmões da poluição dos carros. E não estava a brincar. Também tenho um amigo que se diz não fumador apesar de fumar regularmente um cigarro ou dois à noite em vez de cortar completamente, o que na prática o mantém em privação constante e lhe faz parecer que o cigarro é ainda mais precioso e saboroso que para aquele que fuma 3 maços por dia e odeia 99% dos cigarros. O que o primeiro grupo não sabe é que do ponto de vista de um fumador, o facto de não-fumadores os considerarem personas non-gratas, é um dos maiores bónus que se pode ter ao fumar, visto que personas (cada vez mais) non-gratas tendem a unir-se e a formar uma certa cumplicidade, ainda para mais quando do lado dos anti-tabagistas está um certo espírito persecutório, legislador e ultra-paternalista para com os comportamentos humanos.
Um dos paradoxos que senti na fase da minha independência universitária foi que me identificava mais com as pessoas fumadoras e bebedoras do que com os abstémios e saudáveis. Ainda hoje, a meio de um ciclo de treinos para uma ultra maratona extrema, tendo a confiar e simpatizar mais facilmente num heavy drinker ou num fumador. Ao primeiro “não bebo” ou “nunca fumei”, sinto um travão de autocontrole que me deixa um reflexo de defesa também. Sinto-me melhor num restaurante de fumadores que num de não fumadores. Isto é, evidentemente, irracional, mas prende-se com a sensação de estar num sítio de adultos ou num sítio a fingir. Irracional, eu sei.
Daí até elogiar o acto de fumar, vai uma longa distância e não faço isso. Fumar cria a necessidade que satisfaz – como todos os vícios. É perfeitamente possível e fácil deixar de fumar, mas antes é preciso destruir um a um os mitos e a lavagem cerebral a que nós próprios nos submetemos e ver as coisas pelo que se ganha, logo a começar pelo dinheiro (eu deixei de fumar e ganhei 60 mil euros que era quanto iria gastar até ser extremamente provável um problema de saúde que me obrigasse a deixar, por isso penso sempre que o próximo cigarro me pode custar 60 mil euros, visto que voltaria a ser fumador). O maior problema em deixar de fumar é termos medo de perder parte da nossa identidade, de deixarmos de poder viver momentos que vivíamos. É uma ilusão, mas é um medo, o de nos transformarmos noutra pessoa e perdermos o acesso a momentos e prazeres que tínhamos.

Existe um bom livro sobre o tema, o Quit Smoking, The Easy Way do Allen Carr, que recomendo vivamente a todos os fumadores e não-fumadores também. Deixar de fumar também é uma oportunidade interessante para nos conhecermos melhor.

previsões trocadas

clarke539w
Arthur C. Clarke no 2001 (de 1968) imagina o Newspad, um dispositivo que se assemelha a um telex electrónico que é actualizado de hora a hora pelos satélites de notícias. Floyd, o personagem principal, encontra-se a caminho da Lua num voo quase comercial, com toda a comodidade e usa o seu Newspad. Reflecte que este contém mais informação que ele próprio poderia absorver numa vida e que um dia o dispositivo será substituído por uma coisa impossível de imaginar. Este parágrafo despertou em mim alguma ternura. Arthur C. Clarke, um homem a todos os níveis brilhante, não conseguiu conceber o paradigma de informação instantânea, não forçosamente utilitária, muito menos informativa, multidireccional, não controlada pelos mass media tradicionais do século XX, no fundo, a Internet. Parecia a Arthur C Clarke inconcebível que um dispositivo e satélites não estivessem ao serviço das News num newspad. Clarke estava longe, muito longe de imaginar que o pináculo da evolução do seu Newspad estaria ao serviço de…

lolcats.

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chegaram

Penso que chegou a minha remessa final de livros de ficção científica, uns 10 volumes de classicos. Folheei o Dune de Frank Herbert ao almoço (a trilogia). Promete. O Arthur C Clarke (vou lendo o seu magnífico 2001 Space Odissey) diz que ao nível do Dune, só mesmo o Senhor dos Anéis. E ainda bem que a última vez que vi o estranho (no mau sentido) Dune de David Lynch foi há tempo suficiente para não me contaminar.

vento

Quem me chamou uma vez a atenção para isso pela primeira vez foi um brasileiro numa conversa em São Paulo: “estive em Lisboa duas vezes, nossa, muito vento…” Pela descrição dele, Lisboa era fustigada permanentemente por ventos ciclónicos. E é verdade, podia ser a windy city, especialmente nos meses de verão em que há mais vento. Nota-se a sério se tentarmos estar numa mesa de esplanada com merdas que possam levantar voo, como a conta ou um canto da toalha de papel. Imagino que o Porto seja igual, por estar numa situação geográfica semelhante, talvez pior até (neste particular). Conseguem imaginar o que é estar numa esplanada em que um papel em cima da mesa simplesmente não voa? Eu já experimentei isso uma vez, em Paris. Soube-me tão bem, mas na altura não percebi porquê.

Dá-se o caso de ter recomeçado a andar de bicicleta para o trabalho e nos últimos dias a viagem de volta é um autêntico martírio. Sinto-me num túnel de vento sempre que chego ao topo de uma avenida e tenho de ir duas ou três mudanças abaixo, lentamente. Pelo menos é arejada esta cidade e com ar do mar a maior parte das vezes. Um luxo. De manhã cedinho, parece que dormiu com as janelas abertas a noite toda. Ultimamente tenho vindo por caminhos diferentes para o trabalho. Ir a direito é commute rotineiro, mas basta improvisar um novo caminho todos os dias para ser um passeio.

meteoritos

O Shoemaker-Levy 9 em 1994 chocou com Júpiter e deixou na superfície deste uma cratera do tamanho da Terra, para gáudio dos astrónomos que acompanharam o fenómeno. Mas se os astrónomos ficaram felizes pela ocasião de assistirem a algo raro na escala de tempo humana (comum na do cosmos), o certo é que aquilo foi para a humanidade uma wake up call. Se aconteceu a outro planeta do sistema solar, podia acontecer à Terra. Seria de pensar que se montou um sistema infalível. Nada mais errado. Primeiro, alguns asteroides como o Toutatis que nos faz razias cíclicas, têm órbitas caóticas e impossíveis de prever a médio longo prazo, devido à influência de complexas forças gravíticas. Em Fevereiro do ano passado tivemos o fascinante asteroide de Chelyabinsk, cuja entrada na atmosfera e explosão com a potência de 30hiroshimas  foi filmada por várias câmaras. 1500 feridos sobretudo dos vidros da onda e choque. Não houve qualquer aviso porque a trajectória do asteroide se sobrepunha ao sol. Eu pessoalmente fiquei alarmado.

Já agora, em 1490, ocorrou o ‘Ch’ing-yang event’, uma chuva de asteroides na China que terá vitimado na época 10 mil pessoas, o que significaria 10 milhões hoje em dia. Durmam bem *