um cão

Continuar a alimentar a esperança de encontrar uma mulher muito bonita, com sentido de humor, mentalmente sã e com bom coração é imbecil e irracional e, a muitos níveis, contra-producente. Não só tal fenómeno se afigura raro na espécie feminina com mais de 30 anos, como tendo em conta a realidade fria da minha vida social, em vias de se tornar ainda mais minimalista, e a crescente aversão por pessoas que é inevitável desenvolver por andar de metro diariamente e por ir a dates, não me parece de todo plausível que suceda.

Ultimamente parece que sinto uma coisa cá dentro a morrer à mínima coisa. Pode amar-se verdadeiramente uma mulher que cite Pedro Chagas Freitas? Que diga «os meios de produção são cada vez mais propriedade privada» sem se rir? Que escreva “fizes-te”? Que não goste de cães? Mas gostar de animais nem sempre é bom, quando começam a ficar mais maluquinhas dá-lhes para ficarem muito focadas nisso, e torturam-se a elas e aos outros todos (a minha mãe e ambas as minhas tias padecem disso, para compensar não terem filhos ou estes já terem crescido  desaparecido). Nos jovens é estranho, mas acontece. Há dias apercebi-me, num site de dating, da quantidade de vegans. É possível amar uma vegan?

É evidente que não, a não ser que por amar se entenda um conceito mais amplo, como por exemplo, “tolerar”.

-Conheci a Joana há 4 meses, toleramo-nos vai para 3. Tolero-a imenso. Foi tolerância à primeira vista. Lembras-te querida? Quando disseste aquilo dos imigrantes que deviam voltar para a terra deles que só cá estão para receber o RSI?
– Sim. E tu todo ofendido. Mesmo assim fizemos amor nessa noite.
– Pois foi. Gostei muito do sorriso dela e ambos gostamos de Woody Allen.

Nada disto é novo, há mais de 10 anos já me tinha projectado no futuro como um velho misantropo com um gato porque gosto de animais. Entretanto tive um gato porque não tenho vida para ter cão e percebi que só mesmo um homossexual (assumido ou não) pode dar-se bem com um gato. Nada contra, mas dispenso e dei-o a uma mulher com 4 ou 5 gatos.

Tenho uma filha, o que é fantástico e improvável, mas já está aqui e agora não foge que se lixa. Mesmo que não goste de mim, boa sorte no tribunal para se livrar de mim.

Gostava que tivéssemos um cão, para compor um pouco mais o agregado familiar e estabilizar-me nos dias em que não estou com um deles, para não sentir aquele abismo perigoso. Aquela coisa dos bonecos de peluche espalhados, imóveis, como um instantâneo, um vislumbre da perda, do que seria ela não voltar mais porque nós, os pais, às vezes atrofiamos com essas coisas.

No fundo, era como ter dois cães, um cão e uma cadelita bípede, esperta numas coisas, mas menos noutras. O cão era o irmão mais velho dela. E os três já seríamos uma família. Já nos imagino no carro, eu ao volantes e eles os dois com a cabeça de fora da janela, um em cada espelho retrovisor.

Já andei a ver dog walkers. É muito caro? Alguém sabe? E um com competências de tomar conta de / passear crianças?

para além do estritamente necessário

Mas isso porque tem a confiança de que não foi castradora com ela como a sua mãe foi consigo?
Não, se calhar fui castradora, não sei,. Acho que em Portugal fazem muita falta memórias e autobiografias, em Portugal e nos países latinos não temos essa tradição, porque a Igreja Católica, por um lado, não gosta destas coisas. Nos países católicos pode ser-se hipócrita no que se quiser, até os operários podem pôr os palitos à mulher, podem-se fazer abortos todos os dias e depois dizer que se é contra o aborto, dizer-se que se é a favor da escola pública e depois pôr os filhos numa privada, isso é típico dos países latinos. Os portugueses, sendo pobres, dão imensa importância ao parecer, detestam parecer ridículos. A excentricidade é polida. Alguns amigos meus, com 70 anos como eu, dizem “ah, és tão excêntrica”. Não, não sou excêntrica, sou como sou, não escrevi num papel ‘quando for crescida vou ser excêntrica’. Quero levar a minha vida como quero e não quero que me macem para além do estritamente necessário.

Maria Filomena Mónica, ao i

a vizinha

Sei que já escrevi este post umas 3 vezes, mas o que querem? Sento-me para trabalhar em qualquer coisa interessante, olho pela janela do meu escritório, no entardecer, e lá está ela, o fraquinho platónico de juventude, a estender roupa de bebé, babetes, babygrows, de t-shirt larga, cinzenta e os longos cabelos de um lado do pescoço. O ogre do namorado ou marido a andar de um lado para o outro na cozinha a secar pratos e arrumar, a andar com a passada pesada e elefantina de um homem acabado. Interagem, parecem agastados e eu vejo isto a 100 metros de distância pela forma como ela bate com as costas de uma mão na palma da outra, enfim, a culpa não é dele, elas chegam e passado o amor físico primitivo focam-se em coisas como “não arrumes esses pratos aí, mete antes ali”.

Vista assim de longe a existência humana surge-me francamente deprimente, mas quem olhasse para mim de longe aqui há uns bons tempos veria algo semelhante, excepto com mais nudez, a minha ex andava muitas vezes nua. No início stressava imenso e corria baixar os estores, depois habiuei-me. A 100 metros de minha casa, 200, 300, alguém teria mais sorte do que eu tenho agora.

pessoal dos readers feeds

alterei o post abaixo 500 vezes, a versão que estais a ler pode não ser a última e dizer exactamente o oposto da anterior. Para não irem de mãos a abanar, uma coisa bonita:

“vês Constança? Com este programa do PSD, vamos poder ser pais. Portugal vai ter futuro.” diz Pedro. Constança responde “Não importa, sou uma pessoa feliz, voto onde me disseres para votar.”

pedro

Entretanto, Jorge e Rita, o casal de extrema esquerda, não parecem próximos de chegar a acordo sobre o rumo da política cultural do lar e o destino do orçamento de aluguer de filme no meo. Jorge quer alugar o Land of Plenty do Wim Wenders que, apesar de ser filmado nos EUA, não é um filme propriamente americano, mas sim crítico do capitalismo do mesmo. Mas Rita não cede, fanática de cinema francês, quer ver o Moulin Rouge outra vez nem que o Jorge se foda, apesar deste protestar que Moulin Rouge não é francês. A discussão sobre o que faz um filme ser francês ou americano arrasta-se há horas.

red

não me posso tornar um deles.

Agora é a história do refugiado sírio que vendia canetas no líbano para sustentar a família, o norueguês branco vê, tem pena, tira foto dele com menina ao colo , crowdfounding, pimba, 40 mil euros, foto do norueguês com o sírio, história com final feliz .

Ok, mas há mais de 3 milhões de refugiados Sírios.

Se vamos, como no caso do doente com hepatite e o medicamento de xis mil euros, fazer o final das histórias depender da capacidade de empatia mediática (o artigo do observador bem realça a importância da foto embora com uma postura ingénua e acrítica, bem reveladora), então vamos criar uma selecção com base nisto, uma vez que nem nós vamos ter espaço na cabeça e no facebook, nem os jornais vão ter espaço para 3 milhões de histórias individuais com final feliz.

Tem graça, o liberal sou eu nesta história, mas até eu fico um pouco preocupado com o rumo das coisas. Mas, e se for mesmo assim? O crowdfunding (outra tentativa patética foi o caso grego, o crowdfounding para pagar a dívida ao BCE, lá está, foi inglês que teve pena do grego e o marketizou nos social media) pode ser uma solução?

Por enquanto parece ser para apagar fogachos pontuais e permitir aquele “ohhhh”. É como se fosse “toma lá 10 euros para eu sentir que salvei 3 milhões de refugiados”. Não me interpretem mal, eu acho que as pessoas fazem bem em ajudar, mas ao 4º ou 5º pai com uma filha ao colo, a coisa já nem aparece nos media. Talvez tenha sido sempre assim. O certo é que talvez as pessoas confiem mais num norueguês que tira uma selfie ao lado da família em concreto e na transparência do mecanismo do crowdfunding do que propriamente numa ONG, Unicef, Ami etc. em que suspeitamos que 90% dos donativos são para pagar vencimentos de pessoas da ong.

Quando digo que acho que devíamos apenas pagar impostos para segurança e leis que impeçam um forte de oprimir um fraco (no fundo, a um pequeno passo apenas da anarquia), dizem-me:

“eu não me importo de pagar impostos para pagar a educação ou a saúde de quem não pode”

Precisamente, precisamente, eu também não. Então porque raio assumimos que se não fosse obrigatório como agora é, haveria problema? Ou estamos só a falar da boca para fora? Talvez a observação fosse: “porque assim só eu ou uma minoria que é pagávamos” ou algo do género, um “os outros também têm de pagar”. Cá está, a opressão. Cada homem é uma ilha, acha que só ele é que é boa pessoa, os outros só pagam impostos porque são obrigados. Mas  porquê? Quantos portugueses existirão que acham errado dar um pouco a quem necessita e acham terrível que se gastem milhões para encher de areia a caparica todos os anos?

E se parece simples na educação ou saúde, mas depois começa a confusão com o “mas que tipo de educação? Quantos professores por aluno? Que tipo de saúde? Qual a dimensão das listas de espera para uma operação à coluna? E ao fígado?” etc.  E voltamos ao sírio. Que sírios? E que montante? E quem? O dilema do norueguês da selfie com o Abdulah sírio vs uma coisa tipo ONU é exactamente aquilo a que me refiro. As pessoas fazem escolhas entre duas formas de, teoricamente, ajudar a resolver o mesmo problema.

Duvido muito, duvido muito, que esta minha utopia algum dia avance. Qual utopia? Não sei, não me chateiem. Mas pelo menos eliminava boa parte da hipocrisia e da ineficiência de termos um intermediário em muitas merdas, o estado, que gere recursos que não são dele e que podem explicar que o dinheiro que se gastou com o BPN (e que a julgar pela vox populi todos acham que foi um erro colossal excepto aqueles a quem o dinheiro lhes desapareceria das contas pelas ramificações que estas merdas têm como se vê com os “lesados do BES”) dava para alimentar e abrigar uma quantidade de sírios amplamente mais significativa que o crowdfunding às mijinhas e ainda sobrar para o orçamento de cultura.

O certo é que nós estamos insatisfeitos. Pagámos o estádio de Leiria ou a RTP ou os salários dos juízes do tribunal constitucional, o BPN, um calote grego e as renováveis.  Se me propuserem um sistema em que os recursos que eu produzo não são esbanjados em merdas com que não concordo, e em que vocês podem gastar onde quiserem, abre-se aqui um amplo espaço para sobrarem recursos para eu e milhões de pessoas ajudarem pobres e oprimidos ou coisas que eu e os simpáticos cidadãos, prefiramos. E assim, o dinheiro acaba por reflectir as preferências éticas, ideológicas etc., o que lhe queiram chamar, sem partidos pelo meio, mas sim pessoas que são escolhidas.

Podem dizer: “o estado é pago para gerir esse dinheiro”. Bom, estou consciente da utopia de tudo isto, mas a questão de princípio, acredito nela até ver uma melhor. As eleições são muito pouco um nomear do gestor competente do meu, dos nossos recursos (falemos em recursos, dinheiro é uma tradução dos recursos). Isto é bem óbvio na péssima reputação dos políticos um pouco por todo o mundo: são considerados corruptos, incapazes, estúpidos, incultos, mal preparados… no fundo são bons profissionais na profissão de ser político e serem postos no topo de listas. É nisto que são bons e chegam a ser tão bons e tão focados nisto que às tantas priorizam isso vs vencer as eleições de facto ou ter popularidade e aprovação.

E isto resulta na abstenção enorme, na falta de entusiasmo eleitoral e no facto dos dois partidos menos maus (três contando com o CDS) serem mais ou menos iguais, sobrando à extrema esquerda o ónus de reforçar o extremo destas merdas negativas que vos expliquei aqui, tão bem devo dizer, e cuja existência e ideias, em 2015, é motivo mais do que suficiente para votar no PS, no PSD ou ou CDS, nem que seja para evitar a trapalhada amplamente ineficiente e redundante a que assistimos na Grécia até o Syriza se ter transformado num PS ou algo do género mais normal, tolerável e tolerante.

Adeus.

o vôo feliz do auryn

Toda gente conhece o fantástico hit pop Neverending Story, do Limahl, que contribuiu para o sucesso do filme homónimo de 1984. Já não vejo o filme há muito e é um dos que tenho na calha para ver com a minha filha quando ela começar a compreender melhor essas coisas. Para já o que a faz rir são coisas idiotas e de gosto muito duvidoso como o Sheep in the Island que infelizmente descobri no youtube. O resto da banda sonora, toda em synth pop, é composta pelo grande Giorgio Moroder. Isto lembra-me natais, não sei porquê!

the borderlands (6/10)

borderlands

Piorzito de terror que vi nos últimos tempos (mas ainda assim 828243x superior ao Sniper Americano). Costumo ver os filmes de terror com os headphones wireless para poder ouvir bem os diálogos e ficar imerso, mesmo quando vou fazer chichi ou buscar mais uma cerveja ao frigorífico.

Sabe bem não ter de por na pausa. A minha ex que tinha OCD, se perdesse 1 segundo do genérico “não via o filme” e às vezes eu ainda era suficientemente estúpido para insistir que ela não tinha perdido nada, que era só o genérico ou uma panorâmica de uma vinha. No fucking way. Rewind, play. Tenho saudades dela às vezes.

Às vezes. O filme é mau, mas é mau de uma maneira boa, na estapafurdice do argumento adolescente que parece conter-se o tempo todo para culminar nuns últimos 2 minutos surreais. Acabam por acontecer coisas imprevistas porque estamos à mercê de pessoas com pouco juízo e actores algo tremidos, excepto um. Às vezes a previsibilidade disfarça-se de clássico. Não foi tempo mal passado. Recomendaria? Não. The Taking of Deborah Logan, no género, e falando de filmes de 2015 de terror estilo POV é vastamente superior. Mas foi um patinho feio engraçado que não vou esquecer tão cedo.