Ainda estou deprimido pela nomeação de Calvão da Silva para Ministro da Administração Interna. O facto do Governo estar condenado à partida torna a nomeação ainda mais deplorável. João Miguel Tavares diz bem no Público
Há 14 milhões de razões para João Calvão da Silva não poder ser nomeado ministro, uma por cada euro que Ricardo Salgado recebeu do construtor José Guilherme. E nenhuma razão para que alguém se lembre de o pôr à frente da Administração Interna, tendo em conta que ele foi um dos dois distintos professores de Direito de Coimbra a assinar um parecer atestando a idoneidade de Ricardo Salgado para continuar à frente do BES após ter embolsado a famosa “liberalidade”.
Como se não bastasse a ideia peregrina de chamar “liberalidade” à oferta de um camião de notas, há ainda este facto a reter: José Guilherme era cliente do BESA, do qual o BES detinha então a maioria do capital – e portanto, mesmo que de forma indirecta, cliente de Salgado. Contudo, nada disso impediu Calvão da Silva de assinar um bonito parecer defendendo que a “liberalidade” havia sido apenas retribuição por um “conselho dado a título pessoal”, “fora do exercício das funções” de Salgado, e que por isso não se via “por que razão censurar a sua aceitação”.
Mas há mais. Calvão da Silva decidiu ainda adornar tão belo naco de direito português com reflexões delico-doces sobre a beleza da “entreajuda”. Escreveu o senhor professor de Coimbra: “[Este é] o bom princípio geral de uma sociedade que quer ser uma comunidade – comum unidade – com espírito de entreajuda e solidariedade. De outro modo, ninguém estaria disponível para dar um conselho, uma recomendação ou informação a quem quer que fosse. É natural, pois, que um amigo possa e tenha gosto em dar sugestões, conselhos ou informações a outro amigo.”
Se por um lado parece menos grave por ser inconsequente e não acho que Passo Coelho seja corrupto, é talvez o lado simbólico que me choca mais. Insere-se na mesma linha do elogio de Passos a Dias Loureiro na queijaria. Mais grave foi a manutenção de Relvas (a própria presença dele logo para começar, é incompreensível) muito para lá do admissível. É como se me pedissem amnésia.
Isto demonstra que não existe sensibilidade ética e respeito pela digniddade dos portugueses. Sem noção do certo e errado e da sensibilidade mais essencial que uma população tem, a da reputação, da jutiça, caímos precisamente no que de facto motiva a axcenção da extrema esquerda populista e extrema direita populista em sociedades anteriormente abertas e liberais. Não é coincidÊncia que os radicais do Bloco de Esquerda tenham tido o melhor resultado eleitoral na ressaca do PS ter tido o político mais corrupto dos 40 anos de democracia portuguesa à frente dos seus destinos durante uma década.
Não tenho muitas dúvidas quanto ao desastre que será um governo de “frente esquerda”, mas também não acredito que cheguemos às profundezas do que foi a situação grega e entretanto espero que seja pedagógico. Costa não tem legitimidade política, ao contrário de Tsipras por isso cai mais depressa e espero que rebole para longe.