one happy dog

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Vimos, há dias, um filme de terror muito mau, o Dark Circles. A premissa interessou-nos: um casal fica privado do sono por um bebé a chorar constantemente e começa com alucinações. Ficou por aí o interesse teórico, o filme tem problemas de argumento graves e actores muito maus. Retive uma deixa: “não quero que o meu filho cresça numa cidade”. Acho que foi a única coisa que retive do filme. Isso e uma cena em que um capataz de uma obra reage ao seu carro a ser partido a pé de cabra pelo pai do bebé, tresloucado com o ruído das máquinas do estaleiro, com um “wow wow wow tenha calma” e conclui com um “você precisa de dormir” e o deixa ir à vida dele. Afinal de contas o carro que o homem partiu não era dele. Era só um adereço num filme. Aliás, ele nem é capataz de uma obra, é apenas um actor a fingir que tem um carro que foi partido. Bom, mas como todos os filmes de terror presos a clichés, este não falhou o clássico da mudança da cidade para a casa no campo, isolada e com uma cave cheia de tralha sombria. Eu cresci no campo e tenho muita pena que a minha Júlia não cresça no campo, a começar pela possibilidade de termos cães, esse elemento fundamental à felicidade humana. Mas também tenho pena que não cresça no campo português de 1981 em que ficávamos sem luz durante dias. Isso é que era. Hoje, o que há de comparável? A Marmeleira do Pacheco Pereira que fica sem internet umas horas? Crescer no campo tem lados muito positivos que são bem explorados nestes filmes de terror. À distância, apesar de ter adorado a minha infância, também sei que passei noites aterrado e que na altura senti um alívio enorme quando nos mudámos para um apartamento em Torres Vedras. No campo, a minha imaginação fértil era estimulada por ratazanas no sótão, aranhas em todos os cantos, tábuas a ranger com o vento, relógios de pêndulo com um TIC TAC lúgubre, salamandras a rosnar chamas, vento a uivar nas árvores, ausência de civilização a não ser o escape de uma famel na aldeia vizinha ou os faróis de um carro na estrada sinuosa, filtrados pelas duas linhas de estores entre-abertos, com o quadriculado de luz a deslizar pela parede… Tenho pena que a Júlia não vá experimentar estas coisas e que só as possa ver em filmes de terror de fraca qualidade.

One thought on “one happy dog

  1. Acampar… O meu pai era fã e até nos habituarmos, eram sucessivas noites de terror, em que cada barulhinho e cada sombra eram monstros assassinos . Mais tarde, crescemos e foram os grilos… aos magotes… Um bebé a chorar comparado com isso é peanuts… Não podemos embalar os grilos, dar biberão aos grilos, mudar a fraldinha aos grilos, e os FDP não se calam… Noites a fio… Mas estávamos em comunhão profunda com a natureza… Apesar do Pai não dispensar a Tv, o frigorífico, e outros gadgets que funcionavam engenhosamente nos nossos acampamentos.

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